domingo, 11 de julho de 2010

Emtrevista de João Batista Lemos (Secretário Sindical do CC do PCdoB)

Caminho da consecução de uma estratégia que abra

Horizontes para a transição ao socialismo.

Como foi a Conclat, realizada dia 1º de junho?

Nós fizemos um balanço altamente positivo dessa Conclat porque conseguimos construir uma base política de unidade com todas centrais sindicais existentes no país. A construção dessa unidade deu-se de forma pontual, em torno de uma plataforma formada na luta pela redução da jornada de trabalho, nas marchas pelo aumento real do salário mínimo como uma política permanente do governo Lula. E estava colocado também aí já o Projeto de Desenvolvimento com valorização do trabalho.

Esses fatos foram muito importantes porque fomos construindo uma base de unidade de ação. E, com a Conclat, ocorre um salto. Nós conseguimos uma unidade mais programática, já em torno de uma agenda para um Projeto Nacional de Desenvolvimento com democracia, soberania nacional e valorização do trabalho. Isso é um avanço muito interessante, porque dá uma base mais política para o fortalecimento da própria unidade dos trabalhadores no sentido de intervir no curso da luta no país. Então, o que ocorreu foi um salto na elevação da consciência política da luta dos trabalhadores. Isso teve uma importância grande porque criam-se as bases para desdobramento de outras lutas.


Pode-se dizer que esta Conclat tem paralelo com a de 1981?

Sim. A Conclat de 1981 foi fruto da ascensão do movimento grevista surgido em 1978, quando surgiu a liderança de Lula. A motivação primeira foi econômica, mas acabou, por causa do regime militar, ganhando uma conotação essencialmente política. Essa Conclat reuniu mais de cinco mil delegados, representando bem mais de mil organizações sindicais. Foi uma Conclat unitária, que gerou a comissão nacional Pró-CUT. Ali foi tirado um dia nacional de luta para entregar um manifesto ao governo militar de plantão, reclamando o fim da carestia, o fim do desemprego, do arrocho salarial. E pedindo liberdades políticas.

Nesse momento, os trabalhadores jogaram um papel político importante no movimento das forças democráticas, progressistas, propondo o fim do regime militar. Mesmo com a divisão na comissão Pró-CUT, porque já estava ocorrendo uma disputa muito grande, a disputa da hegemonia entre os operários pelas diferentes correntes, aquela Conclat deu base de unidade de ação para as greves gerais que vieram depois, na década de 1980. A primeira foi ainda unitária, convocada pela comissão Pró-CUT em 1983, mas as demais foram comandadas de forma separada pela CUT e pela então CGT. Então, essa questão da unidade no Brasil, sobretudo depois como processo da luta contra a ditadura, se deu essencialmente na ação, na luta, e não de forma orgânica. Foi um processo muito interessante.


A nova Conclat materializou a proposta original da CTB?

De certa forma sim. A CTB queria uma Conferência que pudesse reunir lideranças sindicais, como foi em 1981, para debater os problemas dos trabalhadores de forma democrática e defender uma plataforma comum em defesa da agenda que foi construída durante esses últimos dois anos de preparação. Defendíamos, inclusive, que tivéssemos encontros estaduais preparatórios que precederiam a fase final. Mas não foi assim que as coisas ocorreram. A CUT, sobretudo, que optou por um caminho mais solo, dificultou muito as ações e articulações unitárias. Ela foi contra a realização de uma Conferência desse tipo. Então, a CUT quis trabalhar mais a ideia de um ato. Tanto que denominação que eles defenderam acabou ficando Conclat – Assembleia Nacional. A CUT é a maior central sindical e teve um peso grande nesse processo. Nós sabemos disso e por isso acatamos essas opiniões, para que a Conclat ocorresse de qualquer forma.

Ainda assim, a construção dessa agenda foi fruto de uma exaustiva jornada. Houve um exaustivo trabalho das centrais. Foram nove reuniões da comissão de redação que produziu nove versões para construir essa plataforma unificada. Então, na verdade, a Conferência de 1º de junho foi o coroamento de todo esse processo de debate e discussão da direção dessas centrais para formular uma plataforma e uma agenda comum. Isso dá base também para um desdobramento maior. Primeiro para fazer vitorioso esse ciclo de mudanças iniciado com o Lula.

A plataforma aprovada no último dia 1º de junho foi a da defesa da continuidade e do aprofundamento do projeto de mudanças iniciado em 2003 com a posse de Lula. Isso ficou claro até mesmo na posição da UGT, que forçada por uma tendência tucana não participou do evento. Então, esse próprio fato mostrou que o 1º de junho reuniu as centrais sindicais e forças políticas do campo aliado do governo Lula. Isso faz com que essa unidade das centrais se fortaleça para, através da influência de suas bases, trabalhar para a vitória de Dilma e evitar o retrocesso no país. E lutar para que seja aplicada essa agenda no governo.

Junto com isso houve também a assembleia dos movimentos sociais, que ocorreu no dia anterior e que também trabalhou uma agenda democrática, popular e progressista. Vai se criando assim no país a construção de um movimento político de massas dos trabalhadores, das forças populares, em torno de um projeto nacional de desenvolvimento com base na soberania, na democracia e na valorização do trabalho. Isso é de grande importância.

O outro movimento que temos de fazer é sobre como colocar essas propostas aprovadas nas ruas, que desdobramento vamos ter. Nesse desdobramento, não podemos ficar no imediatismo, porque foi construída uma base importante. O que foi aprovado em 1º de junho condensa quase que toda a elaboração, a reflexão que essas centrais fizeram nos seus congressos. Então, isso já é uma referência programática unitária para essas cinco centrais, que deverão atrair novamente a UGT. Claro que isso cria uma condição maior de transformar a agenda em movimento concreto de luta dos trabalhadores.

Precisamos primeiro, claro, fazer vitoriosa nesse processo a candidatura de Dilma. E, em um segundo momento, lutar para que essa agenda seja efetivada na pratica. Trabalhar para que seja colocado um programa realmente de ruptura com as forças conservadoras, nacionais e internacionais, para que avancemos no rumo de um novo projeto nacional de desenvolvimento. Um desenvolvimento novo, com base na soberania e na valorização do trabalho. E isso exige um rompimento com o capital financeiro, o que vai depender da construção de uma correlação de forças mais favorável.


As demais centrais vem caminhando nessa direção?

Eu penso que sim. Essa agenda é resultado de uma exaustiva reflexão, de muitos debates. Agora, é construí-la no dia-a-dia. E o protagonismo dos trabalhadores vai ter que transformar essa agenda em coisas concretas e unificar as bases em torno dessa proposta. Isso exige a massificação desse programa aprovado no dia 1º de junho. Já iniciamos o debate desse tema em uma reunião que ocorreu no último dia 28 de junho. Vamos massificar a divulgação do programa aprovado em 1º de junho para ganhar as bases das nossas centrais.

Porque a nossa meta é a construção de uma maioria política para avançar para um novo estágio desse ciclo de desenvolvimento do nosso país. Assumir um novo projeto nacional de desenvolvimento exige correlação de forças favoráveis. Exige rupturas também com o velho, com as forças conservadoras, para avançar o processo. Como nós defendemos reformas estruturais, vamos enfrentar os setores conservadores.

Quando formos defender a reforma agrária, temos que nos preparar para enfrentar o grande agronegócio que hoje se confunde com o grande latifúndio. Quando vamos defender a reforma educacional, vamos enfrentar também as empresas educacionais e o mercado na educação. A mesma coisa na saúde, na questão tributária etc. Então, o avanço de um Projeto Nacional de Desenvolvimento vai exigir rupturas.

E as rupturas exigem uma correlação de forças mais favorável. É aí que os trabalhadores podem jogar um papel fundamental nesse processo de lutar por um projeto mais avançado para o país. Eleger Dilma é o grande e primeiro passo para criarmos uma nova correlação de forças. Ter maioria no Congresso, no Senado e na sociedade é outro desafio para o qual os trabalhadores podem jogar um papel fundamental. E temos esperanças de que teremos essa maioria nas duas casas legislativas federais.


Como Secretário Sindical do Comitê Central do PCdoB, você formulou inicialmente essa proposta de realização de uma nova Conclat. Como foi a trajetória, até chegar ao 1º de junho?

Eu acho que essa questão ficou muito relacionada a uma reflexão que fizemos com a questão da nossa saída da CUT. Porque, para os comunistas, a saída da CUT, a saída de uma organização que é a maior central sindical do país, foi muito cara. Muitos nos indagavam e nós mesmos nos perguntávamos: será que vamos ajudar a dividir, a fragmentar ainda mais o movimento sindical? Mas, com o exame que nós fizemos da realidade brasileira, com as novas condições políticas criadas pela própria vitória do Lula, e a posição muito hegemonista da CUT, impondo as sua posição como força majoritária, excluindo outras forças políticas que não fossem alinhadas à força majoritária do PT, a Articulação, dentro da CUT, vimos que a nossa Corrente Sindical Classista estava represada.

Pensamos que sair da CUT só fazia sentido se fosse para lutar pela unidade e não para dividir ainda mais. Teríamos mais autonomia para construir a unidade das centrais. Analisando o movimento que estava ocorrendo no sindicalismo brasileiro, mais a reconfiguração do movimento sindical com a flexão mais progressista que havia feito a Força Sindical, decidimos por esse caminho. É importante registrar que essa flexão da Força Sindical foi importante, porque anteriormente essa central surgiu para defender as propostas neoliberais no movimento operário.

Querendo ou não, ali foi uma cisão grande no movimento sindical, na história da luta dos trabalhadores, porque uma central que tem o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo do outro lado, defendendo o governo neoliberal, foi uma cisão muito grande. E, com a vitória do Lula, com essa nova reconfiguração, a Força Sindical fez um movimento mais à esquerda. Tanto que ela ajudou e contribuiu para fortalecer todas essas marchas do salário mínimo, as lutas pelas 40 horas semanais, contra a flexibilização dos direitos dos trabalhadores, pela ratificação das convenções da OIT. E deu muita sustentação e apoio às mudanças do governo Lula.

Essa mudança foi fundamental para a unidade da classe trabalhadora, que não passa somente por uma central. A unidade da classe trabalhadora passa pela unidade de ação e fortalecimento do fórum das centrais sindicais. Vimos que, saindo da CUT, formaríamos uma Central que seria instrumento para contribuir com a unificação das centrais na luta. Foi assim que, junto com outras forças políticas, com os socialistas, com setores independentes, fundamos a CTB, propondo, já no seu primeiro congresso de fundação em dezembro de 2007, a realização de uma Conferência Nacional da Classe Trabalhadora em torno de uma agenda com um projeto nacional de desenvolvimento com soberania e valorização do trabalho. Isso está nos nossos anais de fundação da CTB.


Fale um pouco das dificuldades surgidas no caminho da Conclat.

A maior dificuldade foi com a CUT, que num primeiro momento não apoiou a proposta. Por ser a maior central, por ter maior relação de influência no governo — inclusive, dirigentes da CUT se transformaram em ministros —, ela não soube manter a sua autonomia e a sua diferenciação em relação ao governo. E perdeu muito espaço por causa disso.

A posição do governo Lula, de ouvir as centrais quase todo mês, de diálogo com as centrais, exigia maior unidade. Vimos que seria possível construir a Conclat. A Força Sindical assumiu essa bandeira, o que deu concretude à proposta. Com a posição da Força Sindical e das demais centrais que, logo em seguida também assumiram essa bandeira, não havia como a CUT ficar de fora. Isso foi fundamental para legitimar e selar a unidade das centrais.

Outra coisa importante a anotar, para registrar, foi a derrota política dos setores de “esquerda”, mais sectários. Eles também chamaram uma Conclat para fundar uma central. E fizeram todo um movimento, reuniram-se em Santos, mas o congresso não acabou de forma unitária. Saiu uma parte considerável, da Intersindical ligada ao PCB e ao PSOL.


As centrais foram decisivas para garantir o reajuste de 7,7% dos aposentados...

 Lula foi obrigado a ratificar. Nós não conseguimos que o Lula não vetasse o fim do fator previdenciário. Essa luta tem que continuar, porque o fator previdenciário é um retrocesso, faz parte de uma agenda de desmonte do Estado, contra os direitos dos trabalhadores e as políticas públicas, contra os trabalhadores e os aposentados.

E, ao mesmo tempo em que o Lula veta o fim do fator previdenciário, permite o aumento dos juros, que significa uma imensa transferência de renda para os especuladores do mercado financeiro. Esse não é o caminho. E veja só: o governo Lula entrou em contradição com a sua própria política de investimento nas políticas públicas, na infra-estrutura, no crescimento e desenvolvimento do nosso país.


Voltando à Conclat. Você descreve o desenho de uma dialética contraditória. Eu queria que você falasse um pouco da ciência política nesse processo, da sensibilidade política...

Teve ciência política na medida em que a gente vem sistematizando a experiência da luta dos trabalhadores nesse processo, colocando que a unidade é uma necessidade concreta para fazer valer os seus interesses. Isso acaba prevalecendo no processo histórico da luta do movimento sindical. Foi assim com a Conclat de 1981 e com o desdobramento das greves gerais dos anos 1980 e 1990. Agora, a luta política de classe também se dá através da luta política e ideológica.

Veja o caso da Força Sindical. O setor do movimento sindical que cria a Força Sindical e vai para o outro lado, em um período de ofensiva ideológica do neoliberalismo, era de pessoas ligadas ao Partido Comunista Brasileiro, o PCB, o Partidão que foi uma das forças mais influentes na primeira Conclat. No processo político em curso no país, com a vitória das forças democráticas e progressistas, acaba revendo algumas posições na prática e voltando para leito normal da luta de classes, em defesa dos interesses e dos direitos dos trabalhadores.

Essa ciência consiste em a gente compreender o momento político e romper com os esquematismos, em ter uma leitura mais justa do curso dos acontecimentos. Quando nós falávamos em uma nova configuração no movimento sindical, era uma leitura mais próxima da realidade. Sair da CUT era dividir? Não. Nós nos colocamos numa posição para unificar o movimento sindical.

No 1º Conclat os comunistas do PCdoB eram não mais de três dezenas de lideranças sindicais, e hoje são milhares de lideranças sindicais, de operários, trabalhadores e trabalhadoras, da educação, saúde, dos serviços, do campo entre outros. Talvez, seja respondida pela síntese trabalhada por João Amazonas que o Partido tinha que ser ao mesmo tempo de ação política e Partido de classe, depois desenvolvido por Renato Rabelo, combinar dialeticamente os vetores de acumulação de forças de nossa época, a luta política e institucional, a luta de ideias e a luta social. E na luta concreta sindical apesar dos erros que cometemos, poderíamos concluir que se soube trabalhar a consigna da unidade e luta.


Você vê semelhanças nas lutas da América Latina e do Brasil com as da Europa?

Eu acho que aqui têm mudanças de maior sustentabilidade, porque estão se traduzindo em vitórias políticas eleitorais. Tivemos um retrocesso no Chile, mas tivemos uma vitória grande agora no segundo turno na Bolívia com a reeleição de Evo Morales. Tivemos também a vitoria no Uruguai do Mujica e em El Salvador, Maurício Funes. Se a Europa tiver esse desdobramento político-eleitoral através desses movimentos que estão ocorrendo, aí vai dar mais sustentabilidade para mudanças. Tem uma diferença mais no ponto de vista dessa fase política mudancista que está ocorrendo na América Latina, que não está ocorrendo na Europa.

Penso que da Europa também, de certa forma, temos que extrair algumas lições. Porque não conseguimos ainda desenvolver um movimento mais paredista aqui, uma greve geral, por exemplo, para conquistar a redução da jornada de trabalho ou contra o fator previdenciário. Na Europa, eles conseguem fazer esse movimento mais unitário. A Grécia já teve três ou quatro greves gerais, Portugal teve grande movimentação, na França houve várias greves gerais. Nós ainda não estamos conseguindo isso aqui no Brasil. Isso é uma lição.


Estamos criando condições políticas mais favoráveis no Brasil. Com a Conclat, começa a se criar as condições políticas para um movimento mais vigoroso da classe trabalhadora. Estamos construindo essas condições estão sendo amadurecidas. Mas esse movimento só pode ocorrer diante de uma condição política concreta. Essa necessidade pode ser no sentido de fazer avançar o Projeto Nacional de Desenvolvimento. É um movimento que não vai ser feito sem luta de classes, que vai exigir maior vigor da luta dos trabalhadores. Será que nós teremos condições para isso?



Será que teremos?

O sindicalismo na Europa tem estrutura de base dentro das fábricas. Lá existem os comitês sindicais de base. A eleição da direção nacional das centrais como Comissões Obreiras da Espanha começa dentro das empresas. Aqui no Brasil ainda não se permite isso. Essa é uma das nossas mais antigas e históricas reivindicações, ainda não conquistadas. Dentro das empresas é uma dificuldade muito grande para organizar os trabalhadores. Você precisa utilizar de certos subterfúgios, entrar para a CIPA, que tem estabilidade ou utilizar diretores de base do sindicato. Mesmo assim, o Ministério Público está impondo restrições.

Essa é uma questão importante. Por isso que um dos pontos da agenda da classe trabalhadora aprovada em 1º de junho é o reconhecimento legal dos comitês sindicais de base. A outra é a constituição de um conselho de representação das centrais para resolver os problemas de enquadramento sindical ou de disputa das eleições sindicais na base. Hoje ainda há uma disputa muito grande na base e até mesmo fratricida. É preciso mudar também essa estrutura.

Nós estamos vivendo uma estrutura dúbia no movimento sindical, na medida em que se reconhece as centrais, e não mais só o sistema confederativo. Criou-se a pluralidade na cúpula em contradição com a unicidade na base. Tem que resolver isso. Pela própria experiência histórica do movimento sindical, onde não devemos abrir mão da unicidade sindical, sobretudo na base.


Voltando à crise. Você acha possível uma agenda comum em âmbito mais amplo, abrangendo, por exemplo, a Europa, a América Latina, e mesmo os Estados Unidos?

Eu acho que é possível, sobretudo na América Latina e a questão central deve ser a agenda da luta pelo emprego. Vamos realizar agora a terceira edição do Encontro "Nossa América", que vai ocorrer de 22 a 24 de julho, na Venezuela. Vamos contar com a maioria das centrais sindicais do continente. Isso também foi uma proposta nossa da CTB, assim como a Conclat. Já estamos com o apoio da CUT Chile, filiada à Confederação Sindical Internacional – CSI; da CUT Colômbia, também outra filiada à CSI. Estamos também com apoio da CTA da Argentina. Como também da CTC de Cuba, CGTP no Peru, CTE, Equador, todas filiadas à Federação Sindical Mundial – FSM e da PIT-CNT, Uruguai, que é independente, trata-se de construir um espaço de unidade de ação. Vamos ter um grande Encontro, com um caráter antineoliberal, antiimperialista. Em nível mundial, é mais difícil. Penso que é mais interessante uma relação Sul-Sul, ou uma relação dos países do BRIC.

A China buscou fazer um encontro que reuniu esses países. As mesas centrais desse encontro internacional dos trabalhadores eram compostas por centrais sindicais ligados aos países do BRIC. Estavam ali, por representação, 60% da população mundial, buscando uma agenda comum pelo desenvolvimento com geração de emprego, procurando uma forma de combater a crise, de defender o emprego, defender as políticas públicas, reforçar a previdência social. Mesmo na Europa há mudanças nessa direção.

Eu vi o programa do congresso da Federação Sindical Mundial (FSM). Se aquele programa se concretizar, será uma nova etapa da FSM. Como você vê essa expectativa?

Eu vejo dessa forma também. Acho que há uma vontade política muito grande, há uma retomada das lutas em nível mundial mesmo dentro da Europa, que é ainda hegemonizada pela social-democracia. A FSM crescerá na medida em que mudar sua condução, romper com algumas culturas antigas ainda que mencionavam os sindicatos como correias de transmissão dos partidos comunistas, e também na medida em que ampliar e estabelecer mais autonomia, de construção da unidade em torno de projetos com programa comum, de atuar no curso da luta política no momento real do movimento sindical, enfrentando essas novas condições hoje colocadas para a classe trabalhadora em todo o mundo.


Queria que você falasse um pouco como secretário sindical do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Como toda essa ideia que você desenvolveu se insere no Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento? Ela não exige uma sistematização mais elaborada?

É um momento de nós pararmos para sistematizar. O Partido já tem uma experiência acumulada, muito rica. Precisamos sistematizar essa experiência da ação direta entre os trabalhadores e temos procurado fazê-lo com documentos e textos aprovados pelo nosso Comitê Central, agora recententemente reunidos no livro editado pela Anita Garibaldi que organizei e cujo título é “A política sindical do PCdoB”. O Partido tem sistematizado a experiência da luta das forças progressistas nessa proposta de um novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, nas condições da construção de transição para o socialismo, um socialismo com a nossa cara, com as nossas características. É uma sistematização importante, que vai municiar também a luta da classe dos trabalhadores do nosso país.

Voltando ao ente político, ao Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Eu queria que você falasse do seu livro, da sua contribuição para esse debate...

O livro foi uma construção coletiva, que surgiu a partir da necessidade de resposta à luta concreta dos trabalhadores. E também de autocrítica. Aprendemos também com os erros do PCdoB quando nós nos distanciamos da classe trabalhadora. Sempre de forma muito aberta, procurando construir uma identidade maior com a classe, que faz parte da natureza do nosso Partido.

Hoje, estamos diante de um governo que vai avançando, com todas as suas contradições. Estamos, eu diria, em um momento muito particular no nosso país. Porque na crise mundial, estrutural e sistêmica do capitalismo, o Brasil conseguiu sair antes, pelas medidas tomadas pelo governo Lula.

Agora, as experiências no nosso país sempre foram historicamente de buscar uma saída negociada com as elites dominantes, mantendo-as no poder. Acho que aí está, para nós, um desafio muito grande. A tradição, a história do país, mostra que sempre se procurou arrumar um jeito para manter no poder os setores dominantes. Assim foi com a escravidão — acabou a escravidão, mas manteve-se a estrutura da escravidão, como disse o Joaquim Nabuco. Em 1930 também se construiu uma maioria política antiliberal, mas mantendo as elites dominantes e uma saída negociada. Ali já se iniciou um novo projeto desenvolvimentista, que significou um avanço civilizatório para o nosso país. Tivemos o direito ao voto feminino, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o salário mínimo nacional, as primeiras empresas estatais etc. E no segundo governo de Vargas, após 1950, tivemos o monopólio estatal do petróleo e a criação da Petrobras em 1953.

Hoje vivemos uma situação que também tem crise no centro do capitalismo mundial, como em 1930, quando o Brasil soube aproveitar a oportunidade. E estamos, nesse momento, em outras condições. É necessário tirar lições desses processos anteriores. E uma das lições é que deve criar as condições de ruptura com as forças conservadoras. Aliança com o PMDB é justa; o que define é a correlação de forças. Temos de construir uma nova maioria política. Agora, sob qual direção? Aqui é que está a questão para nós. Num passado recente, nosso Partido teve pequena influência política nos rumos do governo e do país. Hoje, as condições melhoraram muito e podemos, num governo como o de Dilma, definir rumos mais avançados para a nação.

Agora, vai depender também do protagonismo dos trabalhadores. Qual desenvolvimento? O que vai concentrar renda, aumentar a desigualdade social? Ou o que vai desenvolver e criar uma condição mais digna para nosso povo, uma condição socialmente mais justa? Isso vai depender muito da intervenção política do protagonismo e a elevação do nível de consciência da classe trabalhadora.

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